18 de fevereiro de 2011

CANTO AO BRASIL


Mandai, ó doces musas
Do Hélicon sagrado
O teu canto ao poeta
Tão longe, ao sul da Hélade
Além do mar oceano
Onde o verão é inverno
E o sol brilha o ano inteiro

Virá das Virgens, filhas
De Zeus e de Memória
Teu cântico, Brasil
Esplendor entre as terras
Roma tardia, porto
De brancos foragidos
E escravos traficados

Canto-te ó pátria nódoa
De negros mutilados
De índios insubmissos
De europeus degredados
Brava gente que em seu
Favor rumina planos
Imperfeitos e ideias

Ao sol do sul nasceste
Sem gládio nem vigília
Quando ligeiras naus
Perdidas te encontraram
- Ou fingiram encontrar -
Emblema de rapina
E dissimulação

Do pau-brasil cortado
A púrpura saía
Em panos e brocados
Ouro, prata, diamante,
E mais cana, café,
Gado: tudo se obtinha
Pra grandeza da Europa

Tirar, tirar, tirar
Foi tua redenção
E há de ser o teu vício
O alguidar das mucamas
As baixelas de prata
A extensão magistral
De tuas costas e crimes

Nobre é teu corpo e a língua
Escorre solecismos
Na noite imaginária
Nem todos são iguais
Ri-se a arraia miúda
O pai perene reina
E a multidão assombra

São muitos os teus deuses
E todos os teus cantos
A alegre sinfonia
Respingada de caos
Por ti se espalha e inventa
Mitos e acende estrelas:
Não és feliz, mas cantas

Das terras verdejantes
A grande parte está
Coberta de miasmas
Um rol de mil espécies
Mescla-se sob o céu
Por aqui nada é
Como devia ser

Cai a noite, sinhá
O dorso da menina
Cria asas e a faz
Voar, comer florestas,
Achar minas perdidas
No fim do mapa, após
A última monção

Alguém aflito sonha
Lugares impossíveis
Homens demais, planícies
Dizimadas, insólita
Junção de vida e morte
Num cenário de cor
Pó, sangue, mar e esperma

Há muita luz, metrópoles
Explodem e as histórias
Comuns identificam
A gente preta e pobre
Que à larga em ti resiste
Gerou um Deus a terra
E as Musas a cantaram

Manoel Olavo

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