28 de agosto de 2012

EMBORA

Seu rosto não é meu
Mas eu entendo. Seu
Corpo não vem
Mas pouco importa. 
Embora seus olhos
Não me fitem único, 
Os dias não sejam bons,
E você de fato nem exista,
Nem eu possa tocar suas 
Mãos sob esta mesa,
Embora eu nem 
Ao menos fale nisso, 
Disfarce, cantarole,
Ignore sua ausência, 
Embora esta gente nula,
Morna, incompetente,
Embora tudo esteja aqui
E não me baste, embora
O dia não traga a boa 
Nova, que seria vê-la,
Eu respiro fundo, me calo,
Relativizo a dor, o fardo, os fatos
Pressinto a dura dádiva
E levo seu olhar adiante.

Manoel Olavo

MÃOS E VERSOS



Nas mãos

O gesto mínimo


Adiante

O labirinto


Letras gotejando

Pelas fendas


E as mãos

Sob um céu

De versos



Manoel Olavo

25 de agosto de 2012

METAMORFOSE



A brisa vem, nos envolve e é bem-vinda

Eu nem fingi saber de onde tu vinhas

De que perdido jardim tinhas chegado

O vento te conduz e eu vi que eram muitas

As sementes de mulher, os dons da graça

Os olhos todos germinando enquanto te abres

Um prisma te desfaz entre os elementos

E, de mulher que eras, viraste brisa, sumo, lira

Flor de Adônis, fonte germinal e tudo foste um dia

Tudo, mulher, já foste um dia, assim oculta

Tão colossal que ainda me conforta

Pois como vou viver sem essa brisa úmida?

Sem a tua metamorfose?


Manoel Olavo

14 de agosto de 2012

FLECHA




Não digam que há escolha
Entre morrer e se petrificar

Já não me basta saber
Da espantosa solidão

De mares que não
Estão na cartografia

Tudo o que fui e serei
Permanece ignorado

Só me resta caminhar
Sobre os escombros

Dançar a beira do abismo
Ultrapassar as alturas

Proibidas; assim posso
Levar meu grito ao vento

Gravar palavras
Num livro desconhecido

Sonhar ser senhor
Da minha criatura

Limite de toda poesia
Flecha na minha carne


Manoel Olavo

VENTO ELÍSIO

Lento e minucioso meu sopro caminha Por seu corpo nu pele branca à mostra. Eu, Elísio, vento soprando na fresta Inspeciono cada ponto oculto...