29 de janeiro de 2011

SIGNOS VOLÁTEIS

A página em branco é sua mortalha.
A diferença entre o existir e a lenda.
Podemos vencer, cruzar o limite
Da montanha, passar sobre o abismo
Ir até onde as nuvens se desfazem.
O dia inteiro, do alto, virão
As águias e as relíquias do vazio.
Contudo ainda persiste a mesma falta
De liberdade, a forma protraída,
A espessura irregular com que o mundo
Se apresenta. Apesar do esforço, o cerne
Não se oferece. Ao anoitecer, tudo
Escapa dos dedos que mal suportam
Erguer o véu das coisas conhecidas.
Como aturar o espelho que distorce?
Até o suposto amor que vai contigo,
O fervilhar de vozes e lembranças
Renascidas, tudo cessa e se cala.
O que existe é um esforço pra ficar
Dentro de si mesmo, nu, elegíaco
Mantendo as fibras juntas sob a pele
Criando matéria com signos voláteis.

Manoel Olavo

16 de janeiro de 2011

METAPOEMA

                                               As coisas
                                               Emitem luz

                                            Ignoram distâncias

                                           Estão no meu jardim
                                           E na Macedônia
                                                        
               As coisas
               São doces
               Prestimosas
               E votivas

                                               As coisas rentes
                                               Ferem o real
                                               Se capturadas
                                               Caem e morrem

As coisas revelam
O pacto entre o
Divino e o sensual

                                    As coisas
                                        (Todas elas)
                                           Carregam
                                                  Um pouco
                                                          De mim


Manoel Olavo

15 de janeiro de 2011

DESTINADOS


Fúria na alma
Seu corpo nu
Me pesa e arfa

Sou só boca
Reentrâncias
De nuca pele
Coxa e seio

O membro
Roçando as
Siderais alturas

Do gozo
(Frente e verso)
Sobre mar revolto

Você, égua da noite
Em mim montada
- Úmida de cio

Dois corpos
Contidos
Um no outro

Como destinados


Manoel Olavo

1 de janeiro de 2011

ARTIFÍCIO



Além
Após passar o dorso
Pela fresta da muralha

Seguir a espiral que espalha
Milhares de trilhas

Após mãos crispadas tatearem
Os ramos de artérias bifurcadas

Após teu passo
Percorrer aléias que tapam
O vazio além do penhasco

O artifício
A queda no abismo

Mas eu estive lá
E vi o dia devastado

Vi o sangue escasso
Num corpo de pó e vidro

Vi a caldeira acesa
A espessura do silêncio
A noite sem cor da lâmina invisível

Como pude não enternecer o coração?
Como pude ignorá-lo?

Beijaste-me e foi pior
Do que haver-te desejado

Cansado
Após passar o dorso
Pela fresta da muralha

Tudo o que vejo é o mar na minha frente

Manoel Olavo

VENTO ELÍSIO

Lento e minucioso meu sopro caminha Por seu corpo nu pele branca à mostra. Eu, Elísio, vento soprando na fresta Inspeciono cada ponto oculto...