ALCMENE
Poucos podem saber
O que nos reserva
O fim deste labirinto:
Um alento, um missal de
Gestos, uma estrela suspensa?
Ou uma impressão de céus,
Um par de mãos crispadas,
Atropelos, azuis em fuga,
Soldados, teorias em círculos,
Uma explosão que vem de longe?
Move-se a terra, ergue-se
O mar, uma nova
Matéria deposita-se
No fundo de crateras.
Ruiu, ruiu, assim todos se calam.
Acima do chão, há cacos de tempo,
Vasos quebrados e Alcmene,
Seu olho de prata sombrio, rútilo, pesado,
Em cores desiguais de medo
E severidade. Da fortaleza, nada resta.
O olho que outrora revelava
Hoje vem nos dizer que não pode.
Esse olho, agora, crê. Profere penas.
Mata o mar que antes prometia,
Fere o chão que antes fecundava.
A medida de cada um de nós
Para sempre está capturada.
A branca virgem Vênus foi esfaqueada.
Vasto céu de noite e conjecturas
Sobre flamejante esfera, vento,
Ameaça, a lei da servidão em gotas,
Tudo em asas se avoluma e morre.
A fábula se antecipa, pressente seu fim.
Mas não!, devemos todos cantar,
Fingir felicidade, desfrutar
Dum passatempo enquanto
O mar inunda a nossa sala.
Será esse maremoto a nossa última poesia?
Manoel Olavo
31 de agosto de 2019
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