30 de junho de 2012

PEGADAS




Se eu pudesse voltar à mesma estrada
Se eu pisasse em cada pegada deixada sobre
                                                        [a terra
Mesmo assim não saberia de mim

Não sou eu quem está ali
Isto se deu noutro tempo
Noutro corpo noutra ocasião

Racionalmente sei que estou nesse mapa
De intenções passageiras e passos dados
Mas só como cartografia

Eu me vejo nos vestígios de existir
O passo gravado me faz recordar
Porém me espanta

Assim rabisco cada folha em branco
Rasgo cada carta antes endereçada
Deduzo aos poucos o que me aconteceu
Quando eu não conseguia ver


Manoel Olavo

17 de junho de 2012

VEM COMIGO, IRMÃO DE SONHOS



Vem comigo, irmão de sonhos,
A serenidade não nos basta.
Juntos subiremos o penhasco
Decifraremos velhos mapas,
Colheremos frutos,
Amores, partituras
E das ruínas surgirá
Um assombroso espetáculo.
Não faremos pausa. Nosso
Caminho é a coletânea
De imagens sobre a pedra.
Em tudo está a união
Das tentativas, o esforço
Dos que nos precederam
E seguem conosco, embora
Transfigurados. Deles
Pouco conhecemos:
Nossa memória é fugaz,
Nossa linguagem
Esconde o que de fato
Se passou conosco.
Vem comigo, irmão de sonhos,
Cruzemos a muralha.
Juntos iremos à última colina
No vale das roseiras ressecadas.
De lá veremos a espiral
Luzindo dunas de ágata,
Juntando sílabas cortadas,
Riscando o ar feito balas.
É um mistério que a vida continue
Após conhecermos seu fracasso.
Só a cartografia nos consola.
Faz com que possamos, de
Algum modo, continuar presentes.
A cada mapa, um vestígio da
Eternidade. Depois aparecem
Litígios, esperanças roubadas;
Grandes geleiras derretem-se em silêncio.
O horizonte ferve, a penumbra acaba
E sóis, incontáveis sóis de rubra pira
Queimam na cidade em polvorosa.
Vem comigo, irmão de sonhos,
Fujamos e busquemos Almada,
A prímula, a hirta fresta,
A fresca sina, a espraiada mancha.
Busquemo-la viva ou em pedaços.
No mar louvemos Atena, seu dourado
Esplendor; partamos em busca
Daquela que sonhamos encontrar.
Talvez ela exista e esteja
Num lugar ignorado,
Límpida, à espera de nós,
Deitada entre lençóis de cânhamo
Jardins de prímulas, colunatas,
Pelúcias e raras pedrarias.
Vem comigo, irmão de sonhos,
Atrás da verdadeira sinfonia.
Talvez ela exista e esteja
Aprisionada em algum
Lugar de nossas vidas
Entre o carmesim e a fúria.

Manoel Olavo


VENTO ELÍSIO

Lento e minucioso meu sopro caminha Por seu corpo nu pele branca à mostra. Eu, Elísio, vento soprando na fresta Inspeciono cada ponto oculto...